O Compliance em empresas públicas
* Maria Fernanda Teixeira e Helena Vasconcellos
Se o compliance nas empresas privadas já é um caminho sem volta, com mais razão ele deve ser aplicado nas empresas públicas. Isso porque a ética está entre os princípios básicos que regem a Administração Pública, muito antes do surgimento da Lei Anticorrupção. É o famoso LIMPE, que abrange os princípios previstos no artigo 37 da Constituição Federal: Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência, todos com o objetivo de garantir a ética, a transparência, a imparcialidade, a obediência à lei e a eficiência na gestão da coisa pública. Seguindo essa linha, a par de toda a legislação esparsa de Direito Administrativo que, muito antes do surgimento do compliance no Brasil, já estabelecia um fio condutor da ética nas empresas públicas, algumas leis e manuais vieram a abordar especificamente a questão do compliance nas empresas públicas. Inicialmente, convém mencionar a própria Lei 12.846/2013, aplicável não apenas às empresas privadas, mas, também, às empresas públicas e às sociedades de economia mista. Na mesma linha, a antiga Corregedoria Geral da União, atual Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle, publicou um Manual destinado ao tema do Programa de Integridade nas Empresas Estatais Federais. Neste documento, a CGU discorre sobre os principais pilares de um programa de compliance efetivo aplicáveis às empresas públicas, sempre fazendo referência à legislação aplicável aos funcionários públicos, como o Código de Ética Profissional do Servidor Público do Poder Executivo Federal, aprovado pelo Decreto n. 1.171/94, quando fala dos padrões de conduta aplicáveis aos funcionários públicos. Na linha do tempo do compliance nas empresas públicas, autores costumam citar, também, o Ofício-Circular CVM/SEP 02/2015, o qual estabeleceu orientações visando garantir a transparência no relacionamento entre as empresas abertas (entre as quais se incluem as sociedades de economia mista abertas) e o mercado em geral. Convém mencionar, também, o Programa Destaque em Governança de Estatais da BM&FBOVESPA, de adesão voluntária, que estabelece critérios para avaliação do nível de maturidade das práticas de governança corporativa das estatais. O grande marco legislativo no compliance das empresas públicas, no entanto, é o novo Regime Jurídico das Estatais, trazido pela Lei n. 13.303/2016. Em linhas gerais, o Regime Jurídico das Estatais estabelece critérios objetivos obrigatórios para a governança das empresas públicas, impondo uma série de requisitos, por exemplo, para a nomeação dos cargos de membros do Conselho de Administração, Diretor, Diretor-Geral, Diretor-Presidente e Presidente de empresas públicas. Entre outros requisitos, a lei exige reputação ilibada, notório conhecimento, 10 anos de experiência na área de atuação (ou em área conexa) da empresa pública ou sociedade de economia mista, 4 anos ocupando cargo de direção, chefia ou equivalente em empresa de porte e setor semelhante ao da empresa pública ou sociedade de economia mista (ou cargo equivalente no setor público ou como pesquisador ou docente nas áreas de atuação da empresa pública ou sociedade de economia mista) ou 4 anos de experiência como profissional liberal em atividade direta ou indiretamente vinculada à área de atuação da empresa pública ou sociedade de economia mista. A lei exige ainda que o profissional nomeado tenha formação acadêmica compatível com o cargo para o qual foi indicado e não se enquadre em hipóteses de inelegibilidade, além de vedar a nomeação de ocupantes de diversos cargos capazes de influenciar na imparcialidade das decisões a serem tomadas no âmbito da empresa pública ou sociedade de economia mista. Todas as cautelas trazidas pelo Regime Jurídico das Estatais visam trazer uma transparência ainda maior às empresas públicas, recrudescendo a cultura de compliance trazida pela Lei Anticorrupção, a qual é inteiramente aplicável às empresas públicas e sociedades de economia mista. Em tempos de Operação Lava-Jato, cabe às empresas públicas dar o exemplo de como gerir a coisa pública, pautando cada vez mais pela aplicação dos princípios de Direito Administrativo previstos no art. 37 da Constituição Federal e prezando pela legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência em seus processos e em sua gestão.
* Maria Fernanda Teixeira e Helena Vasconcellos são, respectivamente, CEO e advogada especialista em compliance e gestão de riscos da Integrow, empresa especializada em diagnóstico e implantação de programas de compliance e ética empresarial
Sobre a Integrow A Integrow – beyond the numbers é uma empresa especializada nas áreas de Governança Corporativa, Gestão de Riscos, Compliance e Ética (GRC+E). A empresa conta com a experiência de mais de 25 anos de seu corpo consultivo no desenvolvimento de programas e projetos de integridade e alinhamento da cultura organizacional. A Integrow já nasceu como uma empresa B (B Corp), ou seja, com o propósito de contribuir para uma sociedade ética por meio da transformação do indivíduo e da cultura das organizações privadas e públicas. Seus clientes são empresas das áreas Financeira, Consumo, Construção Civil, Petroquímica, Logística, Farmacêutica, Têxtil, Varejo, entre outras.